mundo perfeito

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22.3.04

Back to the business

É assim. É como diz o povo. Cria um blogue e deita-te a dormir. Mas a verdade é que não tenho dormido muito. A semana passada (com a estreia do "Vagabundos de Nós" no Maria Matos e a minha participação no espectáculo "Amantes do Jazz" no São Luiz, mais alguns trabalhos de escrita pelo meio) senti-me uma espécie de formiguinha, daquelas que carregam migalhas de pão com dez vezes o seu peso.

No fim-de-semana, o sol bateu-me na janela do quarto lá por volta das onze, o sangue já circulava nas veias com o à vontade dos carros na Lisboa de Agosto e o relógio biológico sussurrava ao ouvido: amanhã começa a Primavera. Então, vai de relaxar um pouco, com família, picanha e caipirinhas com vista para o Tejo.

A Primavera começou, o mundo continua a ser um lugar lixado para viver e eu estou back to the business.

16.3.04

Hoje à noite

Hoje à noite, acontece o ensaio geral de "Vagabundos de nós", a segunda produção do Mundo Perfeito. Estreia a 18 de Março, às 21h, no Teatro Maria Matos. Hoje à noite, o Nuno Lopes e a Márcia Breia estarão, mais do que nunca, vagueando pelo palco imenso do Maria Matos. As personagens que Daniel Sampaio inventou e que Luís Osório encenou, deixam de existir hoje à noite. As luzes do Jorge Ribeiro, a cenografia da Alexandra Cruz, os figurinos da Maria Gonzaga, a produção executiva da Magda Bizarro e todo o esforço da equipa do Maria Matos, não lhes poderão valer. Quando acabar o ensaio geral acabar, morrem as nossas personagens. A partir da estreia, quando forem vocês, os espectadores, a ocupar as cadeiras da plateia, serão outras personagens a habitar o palco. Serão a Mãe e o Filho que vocês quiserem ver. Serão milhares de Mães e Filhos distintos. E a magia será podermos ver a mesma coisa, quando é tão diferente a forma como todos olhamos. TR

15.3.04

Volto já

Fica aqui a promessa de tratar alguns temas. Nomeadamente, o das eleições espanholas, que me tem preenchido os poucos momentos de disponibilidade mental para essas coisas de nos preocuparmos com o mundo. É precisamente por serem poucos esses momentos, porque o trabalho se acumula, que não vos falei disso nem da digressão de "Stand-up Tragedy" em Tomar, nem de tantas outras coisas. Vou só ali ganhar algum para o chop-chop e volto já. TR

9.3.04

Encontro marcado

Hoje, em Coimbra, regresso ao palco com um dos mais apaixonantes espectáculos que já tive a oportunidade de fazer. Chama-se "Stand-up Tragedy" e foi escrito por Luís Filipe Borges e Nuno Costa Santos, dois queridos amigos com quem me cruzei pela primeira vez no programa "Zapping" e com quem agora me cruzo diariamente nas Produções Fictícias.

Construímos este espectáculo no ano passado, com a colaboração de tantas outras pessoas como a Magda Bizarro, o Tiago Gonçalves, o Pedro Almeida, o Alfredo Brito, a equipa do Maria Matos e tantos outros.

Encontrámos espaço e tempo para nos apaixonarmos por uma personagem, o Ricardo Magalhães. Encontrámos as mentiras e a verdade que poderiam ser ditas em palco por esta personagem ambígua, no riso e na tragédia, na realidade e na ficção. Encontrámos mais de 3 mil pessoas que escolheram encontrar-se connosco no Teatro Maria Matos, em Lisboa. Agora, preparamo-nos para outros encontros.

Hoje e amanhã, dias 9 e 10 de Março, estaremos no Teatro Académico Gil Vicente, em Coimbra, às 21h30.

(Vai ser bom voltar a Coimbra, onde estive durante uns meses no ano passado a trabalhar com a malta fantástica do TEUC, ensaiando o "Calígula" de Camus naquela que foi considerada pelo Guiness a sala de espectáculos mais quente do mundo, o Teatro de Bolso.)

Na sexta-feira, dia 12, estaremos em Tomar, no Cine-teatro Paraíso, também às 21h30.

Encontremo-nos. Eu estou sozinho no palco, mas... "it takes two to tango".

6.3.04

O poder é outra coisa

Desde que criei este blogue, no dia especial que é 29 de Fevereiro, falei apenas de projectos do Mundo Perfeito. No entanto, quero que este espaço seja também um lugar de opiniões. Durante esta última semana, alguns amigos (provavelmente, as únicas pessoas que se deram contam da criação deste blogue) chamaram-me à atenção para o perigo que as minhas opiniões poderiam representar para o Mundo Perfeito como produtora de espectáculos e projectos culturais. Ainda por cima nessa área, onde qualquer leve brisa de pensamento político se revela, por norma, muito prejudicial ao negócio. Fizeram-no, sei-o bem, não por falta de coragem, mas por pura amizade.
Durante a semana, o trabalho obrigou-me a relegar para segundo plano a vontade de escrever aqui sobre algumas coisas que tenho visto acontecer. O espectáculo “Vagabundos de Nós”, de Daniel Sampaio, está prestes a estrear no Teatro Maria Matos; o espectáculo “Stand-up Tragedy” faz digressão em Coimbra (Teatro Académico Gil Vicente, 9 e 10 de Março) e, para lá do Mundo Perfeito, o meu trabalho nas Produções Fictícias tem ocupado a maior parte do meu tempo.
No entanto, o debate sobre a despenalização do aborto que regressou, esta semana, à Assembleia, empurra-me para estas linhas. E fá-lo por diversos motivos. Não só pela urgência e relevância social do tema. Também porque se reveste de características que só justificam a minha vontade de usar este espaço.
O PSD absteve-se de tomar uma posição nesta questão. Já muita tinta e outras tantas gargalhadas foram gastas à custa da célebre “não-posição” inventada, num arroubo linguístico, pelo líder de bancada Guilherme Silva. O preço da paz com a potência bélica do CDS/PP é o silêncio acerca de uma questão de consciência, de vida ou morte, de verdade ou mentira, como a despenalização do aborto. Já antes, Guterres tinha optado pelo silêncio. E esta capacidade de transformar um dos poucos debates que preocupa a deficiente opinião pública portuguesa em ficha de póquer do jogo político, é um sintoma da democracia em que vivemos.
A primeira vez que expresso uma opinião pessoal neste espaço é sobre a despenalização do aborto porque considero que este é um assunto que não suporta silêncios. Assumo-me a favor da despenalização, embora considere, como muitos que tomam a mesma posição que eu, que nunca seria capaz de optar pelo aborto. No entanto, estou convicto que prestam melhor serviço a este debate aqueles que considero opositores. Prefiro ter pela frente os que me falam da concepção como início duma vida ou até os que recorrem a argumentos mais hipócritas e demagógicos, do que ter o silêncio laranja. O silêncio é, neste caso, o desprezo pelo tema e pelo sofrimento que ele causa. O silêncio é infame.
O que percebemos, durante esta semana, é que o PSD não quer falar do que se passa para não ter que dizer que sabe o que se passa. Porque se o PSD assumisse que sabe, teria que escolher. E escolher, nestes tempos, é perigoso. Falar, ter opiniões ou convicções, optar, tomar partido, é absolutamente inconciliável com o poder, pensam eles. Por isso escolhi a despenalização do aborto como primeiro tema de um texto aqui no blogue. Porque o que eu penso do poder é outra coisa. TR

1.3.04

Vagabundos

É a segunda criação de teatro do Mundo Perfeito. Reúne pessoas de diversos quadrantes das artes e da comunicação. Daniel Sampaio estreia-se na escrita para teatro e Luís Osório também dá o primeiro passo na encenação. Amigos e cúmplices, Daniel e Luís são a origem deste projecto. Márcia Breia e Nuno Lopes são Mãe e Filho, numa tragédia de encontros e desencontros impossíveis. Todos os dias, nos ensaios da peça, os dois actores têm dado corpo ao que nunca se pode ver: a ausência. O desenho de luz está a cargo de Jorge Ribeiro e a cenografia é da responsabilidade de Alexandra Cruz.
Desde o início do ano que esta equipa habita o Teatro Municipal Maria Matos. É uma sala grande. Nós, do Mundo Perfeito, já lhe conhecemos alguns cantos. Apresentámos nesta sala "Stand-up Tragedy", a nossa primeira produção. Começamos a conseguir caminhar pelos seus corredores mesmo quando a luz já se apagou. Começamos a tratar pessoas e objectos por tu. A equipa deste teatro tem sido de um empenho e hospitalidade invulgares. É bom que o Maria Matos seja um teatro da cidade. Torna a cidade melhor.
Agora faltam 18 dias para que "Vagabundos de Nós" seja, pela primeira vez, mostrado ao público. Como diria a Márcia, citando um dos imensos textos que já lhe passaram pelas mãos, "afivela-se no rosto uma expressão de severidade". E depois sorri. Espero que o público, dia 18, também.